24 de abr. de 2008

A turba do "pega e lincha"

"Eles realizam uma cena da qual eles supõem que seja o que nós, em casa, estamos querendo ver. Parecem se sentir investidos na função de carpideiras oficiais: quando a gente olha, eles devem dar evasão às emoções (raiva, desespero, ódio) que nós, mais comedidos, nas salas e nos botecos do país, reprimiríamos comportadamente.
Pelo que sinto e pelo que ouço ao redor de mim, eles estão errados. O espetáculo que eles nos oferecem inspira um horror que rivaliza com o que é produzido pela morte de Isabella.
Resta que eles supõem nossa cumplicidade, contam com ela. Gritam seu ódio na nossa frente para que, todos juntos, constituamos um grande sujeito coletivo que eles representariam: "nós", que não matamos Isabella; "nós", que amamos e respeitamos as crianças -em suma: "nós", que somos diferentes dos assassinos; "nós", que, portanto, vamos linchar os "culpados".
Em parte, a irritação que sinto ao contemplar a turma do "pega e lincha" tem a ver com isto: eles se agitam para me levar na dança com eles, e eu não quero ir.
(...)
Regra sem exceções conhecidas: a vontade exasperada de afirmar sua diferença é própria de quem se sente ameaçado pela similaridade do outro."

Contardo Calligaris, texto publicado hoje na Folha de SP (aqui, só pra assinantes da Folha ou UOL). Sei que falo para o vento, Marynais deve explicar, mesmo assim recomendo: leiam.

Na mosca.

Um comentário:

Daniel disse...

Ontem o Fantástico ilustrou o que o cara disse no texto. De pessoas gritando justiça na hora do 'ao vivo' até vendedor de algodão doce faturando, tinha de tudo lá. Menção horrorosa para um velho vetido de anjo dizendo que estava se aproveitando da desgraça alheia para divulgar a desgraça da família dele, que era supostamente maior. Encerrado o discurso, guardou a fantasia no sei carro do ano e foi embora.

Triste.